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Dissimulação de fato gerador deve ser esclarecida
É preciso ficar claro não só o que significa a dissimulação, mas também quais procedimentos a Receita Federal vai adotar para fiscalizar esses casos.
A regulamentação do parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, que trata da elisão fiscal, deverá esclarecer o que o legislador quis dizer com "dissimulação" do fato gerador. A avaliação é do tributaristaAlexandre Naoki Nishioka, do escritório Wald e Associados Advogados, que acredita que apenas com a definição do termo será reconhecido o verdadeiro alcance do dispositivo.
"É preciso ficar claro não só o que significa a dissimulação, mas também quais procedimentos a Receita Federal vai adotar para fiscalizar esses casos. Isso trará mais segurança jurídica ao contribuinte, uma certeza maior em relação à interpretação da lei", afirmou o advogado. Ele, que também é membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), tratou do tema na palestra "Planejamento Tributário: a regulamentação do parágrafo único do artigo 116 do CTN", realizada nesta quinta-feira (28/10) durante o Seminário de Direito Tributário da Associação Paulista de Estudos Tributários (Apet).
Divergências de interpretação
Para diminuir o impacto da alta carga de tributos no Brasil, muitas empresas buscam formas legais, por meio do planejamento tributário, para pagar menos impostos. Dados da Receita apontam que cerca de 25 milhões de contribuintes com grande aporte de renda recorrem ao planejamento tributário.
Desde a implantação do artigo único ao artigo 116 do CTN, por meio da Lei Complementar 104/01, o assunto tem gerado polêmica. Diz o parágrafo que "a autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária".
Ou seja, o dispositivo deu um instrumento para que a autoridade fazendária exigisse o pagamento de impostos mesmo nos casos em que ele foi evitado pelo planejamento tributário com a chamada elisão fiscal. No entanto, não há consenso sobre o real significado do termo dissimulação.
O conceito é muito aberto, segundo Nishioka. Ele destaca ainda que, se a interpretação é de que dissimulação é o mesmo que simulação, o que equivale à fraude, não haveria razão para a edição da LC 104, pois o inciso 7 do artigo 149 do CTN já trata de dolo, fraude ou simulação para que haja o lançamento de ofício do Fisco. "Com essa interpretação, a Lei Complementar 'chove no molhado'. O que se observa é que o legislador não é jurista e, às vezes, ao editar as leis, ficam essas brechas de interpretação na legislação."
Nishioka ressalta que o anteprojeto e o projeto de lei do CTN, publicado em 1966, apresentavam duas propostas que poderiam ter evitado as polêmicas com relação à elisão fiscal. Uma delas é o combate do abuso da forma jurídica de direito privado, ou seja, o ato em que se evita a incidência de uma norma com a aplicação de outra norma mais benéfica. A outra é a teoria da interpretação econômica, que prestigia o resultado econômico em detrimento do negócio jurídico para a tributação. "Se eu tenho dois negócios jurídicos diferentes com mesma capacidade econômica, porém um deles não tem previsão legal de seu fato gerador, então eles têm de ter a mesma tributação, de acordo com a teoria", explicou o tributarista.
Como as duas propostas não foram acolhidas pelo CTN, foi necessária a instituição da Lei Complementar sobre a elisão fiscal. No entanto, não bastou a inclusão do parágrafo único do artigo 116. A norma ainda precisa ser regulamentada. Isso porque, apesar de realizar o lançamento para combater o planejamento tributário considerado ilegal — atualmente, a Receita possui cerca de 500 fiscais que tratam apenas de planejamento tributário —, na prática, a administração não tem uma multa qualificadora. O que, para Nishioka, é uma contradição. Ele destacou que a regulamentação da lei vai deixar claro as distinções entre elisão, evasão e elusão fiscal.
Segundo o tributarista, a elisão utiliza métodos legais para diminuir o peso da carga tributária e não tem repressão pelo ordenamento jurídico. A evasão, constituída pelo inciso 7 do artigo 149 do CTN, trata de casos em que o contribuinte se utiliza de meios ilícitos para escapar da tributação, como a sonegação. Já a elusão é quando há simulação do fato gerador.
Grupo de estudo
A maneira encontrada pela administração pública para regulamentar a norma foi a publicação da Medida Provisória 66, em 2002, que previa, nos artigos 13 a 19, os procedimentos que deveriam ser adotados para a fiscalização da elisão. A MP chegou a ser transformada em projeto de lei, porém, nunca foi votada. Para a Receita, a lei que trata de norma antielisiva é importante para evitar o entendimento, por parte do contribuinte, de que tudo o que não é proibido pela legislação pode ser feito. Com a regulamentação, Nishioka não vê prejuízos para o contribuinte. "Ao demonstrar interesse em regulamentar a norma, o Fisco reconhece que existe uma diferença entre dissimulação e simulação, o que é muito positivo."
No início do mês, as subsecretarias da Fiscalização e de Tributação e Contencioso da Receita organizaram o Seminário Internacional Sobre Regulamentação da Norma Geral Antielisiva. O evento reuniu tributaristas, profissionais da Receita, acadêmicos e representantes de contribuintes para pensar os mecanismos e as normas que devem balizar a atuação da administração tributária. Após os trabalhos do grupo de estudo, o secretário da Receita Federal, Otacílio Cartaxo, informou que a proposta de um projeto de lei pode ficar pronto no próximo ano.
"A Receita está tomando medidas para deixar clara as suas intenções sobre elisão. A partir disso, o contribuinte saberá, de fato, o que será permitido para fazer o planejamento tributário e terá garantido o direito ao contraditório e à ampla defesa", finaliza Nishioka.
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