Até 2020, a sustentação oral era a única possibilidade de apresentar os argumentos de defesa antes da análise do conselheiro relator do processo
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Para STF, Receita Federal pode monitorar finanças dos contribuintes
Corte determinou ação do Fisco como constitucional
O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou constitucional a regra que permite à Receita Federal monitorar movimentações financeiras de pessoas físicas e jurídicas sem autorização judicial. Com base nessa lei, foi editada Instrução Normativa no ano passado determinando que os bancos informem ao Fisco movimentação financeira mensal acima de R$ 2 mil feita por pessoas físicas e acima de R$ 6 mil feita por pessoas jurídicas. A decisão foi tomada por nove votos a dois e representa alívio para o Fisco, que considera a norma fundamental para evitar a sonegação fiscal e a ocorrência de outros crimes financeiros.
Os ministros do STF afirmaram que o monitoramento da Receita só pode ser realizado se houver procedimento administrativo instaurado para apurar a suposta infração cometida pelo contribuinte. Nesses casos, o contribuinte terá de ser notificado imediatamente para providenciar a defesa. Essa conduta deve ser adotada por órgãos federais, estaduais e municipais.
— Não é possível permitir que o Fisco fique manipulando os dados sigilosos por muito tempo sem notificar o contribuinte — disse o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski.
O julgamento começou na semana passada, quando já foi delineado placar favorável à Receita. A sessão desta quarta-feira confirmou a tendência e sacramentou a vitória do Fisco. A decisão foi tomada no julgamento de ações em que a Confederação Nacional do Comércio (CNC), da Confederação Nacional da Indústria (CNI), do Partido Social Liberal (PSL) e do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) pediam o banimento da lei. Também foi analisado um recurso proposto por um contribuinte, com repercussão geral – ou seja, a decisão tomada pelo STF no caso específico terá de ser aplicada por juízes de todo o país no julgamento de casos semelhantes.
Nas ações, as entidades sustentaram que a regra da Receita Federal fere as garantias constitucionais à intimidade e ao sigilo de dados pessoais. Para a maioria dos ministros do STF, a norma não representa quebra de sigilo, porque as informações seriam apenas transferidas das instituições financeiras para o Fisco, sem a permissão para serem divulgadas a outros órgãos ou pessoas. Portanto, o sigilo ficaria mantido.
Os ministros lembraram que auditores da Receita que vazarem informações sigilosas sobre contribuintes podem ser responsabilizados administrativamente e criminalmente por desvio de comportamento. Os ministros também ponderaram que a norma é importante para garantir a arrecadação de impostos e frear o cometimento de crimes – como a sonegação fiscal, a lavagem de dinheiro e a corrupção.
Os dois relatores das ações, ministros Edson Fachin e Dias Toffoli, defenderam a constitucionalidade da lei. Concordaram com eles os ministros Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Lewandowski.
— Ninguém duvida que o indivíduo tem o direito de manter longe dos olhos públicos suas informações privadas, inclusive as relativas à vida financeira. No entanto, o Fisco tem o dever de identificar o patrimônio, o rendimento e as atividades econômicas do contribuinte, conforme previsto na Constituição, e precisa dos meios necessários para tanto — declarou Gilmar na sessão desta quarta-feira.
Os ministros Marco Aurélio, que votou na semana passada, e Celso de Mello, que votou hoje, argumentaram que o poder público não pode vasculhar as contas dos contribuintes arbitrariamente, sem autorização do Judiciário. Segundo esses ministros, a quebra de sigilo bancário deve ser autorizada por um juiz diante de indícios do cometimento de algum crime.
— A administração tributária, embora podendo muito, não pode tudo _ disse Celso de Mello, o mais antigo integrante do STF. _ Sob pena de inadmissível consagração de eventual atuação arbitrária do Estado, com inaceitável comprometimento do direito que assiste a qualquer pessoa, uma vez que quebra de sigilo não pode converter-se em instrumento de indiscriminada devassa, havendo necessidade, caberá à administração tributária dirigir-se ao Poder Judiciário — concluiu o decano.
Os processos questionam a Lei Complementar 105, de 2001, que autorizou as autoridades fiscais a acessar informações bancárias dos contribuintes sem necessidade de decisão judicial autorizando a quebra do sigilo. Em julho de 2015, a Instrução Normativa 1.571 determinou que os bancos informem ao Fisco movimentação financeira mensal acima de R$ 2 mil feita por pessoas físicas e acima de R$ 6 mil feita por pessoas jurídicas. A Instrução Normativa criou a e-Financeira, um sistema que obriga as instituições financeiras a informar eletronicamente essas transações à Receita Federal.
A entrega de dados é feita não apenas pelos bancos, mas por seguradoras, corretoras de valores, distribuidores de títulos e valores mobiliários, administradores de consórcios e entidades de previdência complementar. Com esses dados, o Fisco vai cruzar informações para verificar compatibilidade com os valores apresentados na declaração do Imposto de Renda.
O primeiro dia de julgamento foi dedicado à sustentação oral de advogados favoráveis e contrários à lei. Além disso, a Advocacia Geral da União (AGU), a Procuradoria Geral da República o Banco Central defenderam a legitimidade do monitoramento por parte da Receita Federal.
— A intimidade e a vida privada não podem ser escudos para aceitarmos o assassinato da cidadania pela corrupção, pela lavagem de dinheiro, dentre outros ilícitos graves que assolam a sociedade brasileira — sustentou o procurador-geral do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira.
— Nos EUA, qualquer transação realizada acima de 10 mil dólares é automaticamente comunicada à autoridade tributária, e continua sendo uma democracia. A atuação administrativa se dá da mesma forma que ocorre no Brasil. Não há aqui quebra de sigilo, o que há é a transferência do sigilo a órgãos que têm como atividade própria a lida com o sigilo no seu dia a dia — explicou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
MINISTÉRIO DA FAZENDA COMEMORA
O Ministério da Fazenda divulgou uma nota comemorando “a obtenção de importante vitória” com o reconhecimento do Supremo Tribunal Federal (STF) do direito do Fisco de ter acesso direto aos dados bancários de contribuintes, sem precisar recorrer à Justiça.
Segundo a nota, “a decisão reafirma a retidão do procedimento estabelecido no âmbito da Receita Federal do Brasil, forte no zelo pela observância do devido processo legal e na preservação do sigilo fiscal”.
O texto ainda diz que a decisão do STF garante a manutenção do Brasil no rol de países que estabeleceram uma cooperação internacional para trocas de informações (entre elas dados bancários), a fim de identificar possíveis casos de lavagem de dinheiro, narcotráfico e terrorismo.
A Receita Federal já havia partido para o ataque e publicou, na última semana, uma extensa defesa do direito de acesso direto do Fisco aos dados bancários. Segundo a Receita, o sigilo bancário é apenas transferido ao órgão e não é quebrado, à medida que não há divulgação das informações. Além disso, alegou que a prática é uma tendência internacional.
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